ENTREVISTA: da matemática a sustentabilidade pesqueira

ENTREVISTA: da matemática a sustentabilidade pesqueira

A vice-diretora executiva do CeDePesca Gabriela Mc Lean analisou sua transformação profissional. “Por trás de cada relatório ou projeto há muita matemática”, afirmou.

“Sou licenciada em matemática”. Assim começa a entrevista com Gabriela Mc Lean, subdiretora executiva do CeDePesca, que abre a porta a uma fascinante história que teve uma volta de 180 graus e que hoje a encontra abraçando uma atividade que, até poucos anos atrás, era totalmente desconhecida para ela.

Para esta panamenha, oriunda de uma família conformada por engenheiros e artistas, o ano de 2007 marcou um ponto de inflexão na sua vida. Depois de se graduar como Licenciada em Matemática com a melhor média da sua carreira em uma das universidades mais prestigiadas do seu país (Universidad de Panamá, Mc Lean recebeu um telefonema que provocaria uma mudança absoluta nas suas aspirações.

Como se iniciou sua relação com a atividade pesqueira?

-Em 2007, a Autoridade de Recursos Aquáticos (ARAP), foi criada no Panamá, e dentro dela foi conformada a Direção Geral de Investigação e Desenvolvimento Pesqueiro. O primeiro administrador da ARAP, Dr. Richard Pretto, considerou que seria mais fácil formar um matemático em questões de biologia marinha do que um biólogo em conceitos matemáticos. Pediram referências e foi assim que surgiu meu nome. Até então nunca tinha considerado a pesca uma opção dentro da minha profissão, mas fui à entrevista, interessei-me pelo tema e foi assim que começou a minha relação com esta atividade. Me preparei, entendendo mais sobre peixes, biologia pesqueira, um pouco autodidata e um pouco através de cursos.

Então, não sabia do CeDePesca…

Nessa época conheci Ernesto Godelman que era representante do MSC e diretor de uma organização chamada CeDePesca, que ainda não tinha muita projeção em outros países e eu desconhecia a sua existência. CeDePesca sempre apoiou a formação de pessoal e através da colaboração com a ARAP comecei a participar de cursos em outros países e a ter maior interação com eles. Tive a oportunidade de viajar para Mar del Plata para fazer uma especialização em pescaria marinha, solicitei uma licença à ARAP e logo após terminar essa formação, no ano 2009 comecei a desempenhar tarefas para o CeDePesca. Primeiro através de consultorias muito pontuais relacionadas à descrição de pescarias para Projetos de Melhoria, que era um modelo que começava a ser testado. Com o tempo fui avançando dentro da organização até a atualidade onde sou vice-diretora executiva.

Imagino que seu primeiro embarque deve ter sido inesquecível…

-Duas semanas depois de estar na ARAP informaram-me que tinha que embarcar no navio oceanográfico Miguel Oliver e o Dr. Pretto disse-me ‘esta é a sua primeira oportunidade de ver peixes’ porque nunca tinha estado em um barco e nem sequer sei nadar. Foi meu primeiro contato com esse mundo e percebi que não estava tão longe de tudo isso, porque os oceanógrafos são físicos com boa formação matemática, mas você também começa a entender a vida do biólogo e seu entusiasmo pela tarefa que desempenham.

Você conseguiu transferir seus conhecimentos matemático?

-Sim, claro, porque as avaliações de estoques têm uma modelagem matemática por trás e porque na matemática, além da parte abstrata, o pensamento que você tem que ter para fazer as coisas é muito lógico, analisando tudo que está ao redor, integrando-os, sintetizando e esse exercício que você desenvolve ao longo dos anos de estudar uma licenciatura, e tudo isso o aplicas quando entra em um projeto de uma pescaria. E fica claro que por trás de cada informe há muita matemática.

Os projetos de melhoria em que o CeDePesca está envolvido requerem um contato regular com empresários da pesca. Você se sentiu desconfortável nesse relacionamento?

-Parece que existe um estereótipo de que os empresários não estão interessados no tema da sustentabilidade ou na tarefa de melhorar as pescarias e a verdade é que muitos estão dispostos a fazer mudanças nas suas práticas, mas nem sempre sabem bem por onde começar, mas «Além do fato de serem mais pragmáticos e de o analisarem sempre do ponto de vista de se isso os beneficia na abertura de mercados e um melhor posicionamento dos seus produtos.»

Você já se sentiu excluída por vir de outro ambiente ou por ser mulher?

-Diria que não. Além do fato de a nível científico o número de homens e mulheres ser mais equilibrado, quando vamos falar com empresários percebemos que é uma área que segue dominada por homens, mas nunca senti que eles não me prestam a mesma atenção ou não me levem a sério.

Você consegue imaginar sua vida sem CeDePesca?

-Não, porque me deu muitas oportunidades desde o aspecto profissional e pessoal, como a possibilidade de interagir com pessoas de outras culturas, conhecer outros países, fazer amigos, porque considero o CeDePesca como uma família. E eu também não iria para outra ONG porque já faz parte da minha identidade.